quarta-feira, 7 de setembro de 2011

ASSALTO



- Alô? Quem tá falando?
- Aqui é o ladrão.
- Desculpe, a telefonista deve ter se enganado, eu não queria
  falar com o dono do banco. Tem algum funcionário aí?
- Não, os funcionário tá tudo refém.
- Há, eu entendo. Afinal, eles trabalham quatorze horas por dia,
  ganham um salário ridículo, vivem levando esporro, mas não
  pedem demissão porque não encontram outro emprego, né?
  Vida difícil... Mas será que eu não poderia dar uma palavrinha
  com um deles?
- Impossível. Eles tá tudo amordaçado.
- Foi o que pensei. Gestão moderna, né? Se fizerem qualquer
  crítica, vão pro olho da rua. Não haverá, então, algum chefe
  por aí?
- Claro que não mermão. Quanta inguinorânça! O chefe tá na
  cadeia, que é o lugar mais seguro pra se comandar assalto!
- Bom... Sabe o que é? Eu tenho uma conta...
- Tamo levando tudo, ô bacana. O saldo da tua conta é zero!
- Não, isso eu já sabia. Eu sou professor! O que eu queria
  mesmo era uma informação sobre juro.
- Companheiro, eu sou um ladrão pé-de-chinelo. Meu negócio é
  pequeno. Assalto a banco, vez ou outra um sequestro.. Pra
  saber de juro é melhor tu ligá pra Brasília.
- Sei, sei. O senhor tá na informalidade, né? Também, com o
  preço que tão cobrando por um voto hoje em dia... Mas, será
  que não podia fazer um favor pra mim? É que eu atrasei o
  pagamento do cartão e queria saber quanto vou pagar de
  taxa.
- Tu tá pensando que eu tô brincando? Isso é um assalto!
- Longe de mim pensar que o senhor está de brincadeira! Que é
  um assalto eu sei perfeitamente; ninguém no mundo cobra os
  juros que cobram no Brasil. Mas queria saber o número
  preciso: seis por cento, sete por cento?
- Eu acho que tu não tá entendendo, ô mané. Sou assaltante.
  Trabalho na base da intimidação e da chantagem, saca?
- Ah, já tava esperando. Você vai querer vender um seguro de
  vida ou um título de capitalização, né?
- Não... Já falei... Eu sou... Peraí bacana... Hoje eu tô bonzinho e
  vou quebrar o teu galho.
  (... um minuto depois)
- Alô? O sujeito aqui tá dizendo que é oito por cento ao mês.
- Puxa, que incrível!
- Incrive por quê? Tu achava que era menos?
- Não, achava que era mais ou menos isso mesmo. Tô
  impressionado é que, pela primeira vez na vida, eu consegui
  obter uma informação de uma empresa prestadora de serviço
  pelo telefone em menos de meia hora e sem ouvir 'Pour Elise'.
- Quer saber? Fui com a tua cara. Acabei de dar umas
  bordoadas no gerente e ele falou que vai te dar um desconto.
  Só vai te cobrar quatro por cento, tá ligado?
- Não acredito! E eu não vou ter que comprar nenhum produto
  do banco?
- Nadica de nada, já tá tudo acertado!
- Muito obrigado, meu senhor. Nunca fui tratado dessa...
  (de repente, ouvem-se tiros e gritos)
- Ih, sujou! Puliça!
- Polícia? Que polícia? Alô? Alô?
  (sinal de ocupado...)
- Droga! Maldito Estado: quando o negócio começa a
  funcionar, entra o Governo e estraga tudo!

 
Luís Fernando Veríssimo

ENVIADO POR FABIO BATALHA

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